Simone reacende a chama em ‘Da gente’, álbum regido pela força do desejo

  • Simone reacende a chama em ‘Da gente’, álbum regido pela força do desejo

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    Da gente é o melhor álbum que Simone poderia lançar em 2022, aos 72 anos de vida e 49 de carreira. Refém do passado glorioso que viveu na gravadora Odeon de 1973 a 1980, período em que apresentou antológicos álbuns geridos pela densidade da MPB da época, a baiana da gema volta ao disco sob a regência da força do agora, como canta em A gente se aproveita (2019), música do compositor recifense Martins que exemplifica o tom desse álbum em que Simone mantém alta a chama do amor e do desejo ao dar voz a músicas de compositores nordestinos, a maioria gente nova que ainda busca ser ouvida além dos nichos local.

    Com 12 faixas que se afinam, Da gente é disco pautado tanto pela direção artística de Zélia Duncan – com quem Simone fez em 2006 show memorável eternizado no CD e DVD Amigo é casa – Ao vivo (2008) – quanto pela direção musical do pernambucano Juliano Holanda, de quem Zélia se tornou parceira nos últimos anos.

    É da lavra da dupla, a propósito, uma das melhores músicas do álbum, Boca em brasa. Com o calor dos tambores de Pernambuco, evocados pelo toque percussivo do músico Rapha B (bateria, udu, clave e ganzá), Boca em brasa cospe na pisada do baião a quentura do tesão na sequência da canção reflexiva Haja terapia (Juliano Holanda, 2021).

    Haja terapia é tema confessional em que Simone expõe angústias e cansaços da era pandêmica em gravação apresentada em single editado em 18 de fevereiro, um mês antes do álbum, que desembarca amanhã, 18 de março, nos players digitais (a edição em CD do álbum Da gente está prevista para abril pela gravadora Biscoito Fino).

    Uma das melhores canções de Juliano Holanda, Haja terapia abre o disco como pista falsa de Da gente, porque o disco espanta a depressão e a melancolia com a alta dose de sensualidade latente em canções como Nua, parceria de Simone – compositora bem ocasional – com o poeta português Tiago Torres da Silva que soa menos imponente no conjunto da obra (Nua foi apresentada na série de 37 lives dominicais feitas pela artista entre abril e dezembro de 2020).

    A melancolia embarca na viagem de trem que conduz Dezembros (Raimundo Fagner, Zeca Baleiro e Fausto Nilo, 2003) por trama de violões, mas é a força do desejo e do amor que impulsiona o disco.

    Introduzida pela fricção dos violões de Webster Santos, músico habituado a tocar com Zélia Duncan e arregimentado pelo produtor musical Juliano Holanda (responsável pelos toques do baixo e do violão de aço no disco) a regravação de Estilhaços (1980) – música-título do segundo álbum da cantora e compositora paraibana Cátia de França – acomoda Simone em “leito leve de amor”, levado pela pulsação da percussão e da poesia da autora nesta canção que celebra a vida sem apegos, como uma partida constante.